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DEPOIMENTOS DE QUEM VIU E “VIVEU” O ACIDENTE

São Luis-MA, 11 de novembro de 1994
NAVIO TRADE DARING SE PARTE AO MEIO NO TERMINAL DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE

Num dia tranquilo de operações no Terminal de Ponta da Madeira, da então Companhia Vale do Rio Doce, em São Luís do Maranhão, um acidente mudou critérios, tornou as regras e os procedimentos mais rígidos e desde então nunca mais os chamados planos de cargas foram tratados sem que antes houvesse uma análise rigorosa dos efeitos que este provocasse na estrutura do navios que está sendo carregado. A própria DPC baixou uma norma regulando a entrada de embarcações com ou com mais de 18 anos tentantdo dessa forma evitar que episódios como aqueles nunca mais se repetissem. Foi no dia 11 de novembro de 1994 e o navio da foto, dobrado ao meio, é o Trade Daring. A seguir alguns depoimentos de pessoas que viveram este momento e, 18 anos depois, manifestam suas opiniões sobre o trágico acontecimento.

COMANDANTE CARLOS ALBERTO SANTOS  RAMOS

Carlos Alberto Santos Ramos é oficial da Reserva da Marinha e ocupava na época do acidente o cargo de Capitão dos Portos do Maranhão.

“Há quase dezoito anos, ocorria no complexo portuário de São Luis, Píer I do Terminal Marítimo da Ponta da Madeira, um inusitado acidente da navegação, o tosamento-avaria no casco do navio graneleiro Trade Daring levando a ruptura do mesmo. Esse navio tinha sido construído há mais de quinze anos e seu estado de manutenção estrutural e de instalações de maquinas era precário. Sem duvida essa situação muito contribuiu para que não suportasse a reite de carregamento de minério de ferro pelo ship loader do Píer I. É importante ressaltar que os certificados e documentos do navio estavam todos atualizados pela sociedade classificadora, permitindo o navio a operar normalmente no tráfego marítimo internacional.

Após esse acidente, passou a ser exigido pela autoridade marítima brasileira, que todo navio com idade de 18 anos ou mais deverá ser submetido a uma vistoria de condição por uma sociedade classificadora, para que seja atestado se o navio apresenta condições estruturais satisfatórias para realizar o carregamento de granel pesado, aquele com peso especifico igual ou superior a 1,78 ton/m3. Alem dessa exigência o navio é submetido à inspeção Port State Control, quando são verificadas as condições de navegação,maquinas e documental do navio. Todo esse atual controle não existia, quando do acidente do trade daring.

O hoje oficial da reserva da Marinha Carlos Alberto Santos Ramos era o Capitão dos Portos do Maranhão, na época em que ocorreu o acidente com o Trade Daring”.

SÉRGIO ANTÔNIO GUIMARÃES

Sérgio Antonio Guimarães é hoje empresário e na época do acidente ocupava o cargo de Gerente de Comunicação Empresaria da Companhia Vale do Rio Doce.

“O affair Trade Daring foi uma prova da capacidade de mobilização da equipe Vale ao enfrentar situações novas e inusitadas. De repente, não mais que de repente, o principal pier da Vale, no Porto de Ponta da Madeira via-se completamente impedido de funcionar: O Navio Trade Daring havia-se partido ao meio, formando um V, onde o vértice apoiava-se no fundo e proa e popa ficavam aparentes. Foram 35 dias de incansável luta, comandada pelo próprio Presidente da Vale, Francisco Schettino. Seria necessário fazer flutuar o navio e, para tanto, teria que ser retirado todo o minério dos porões do navio para, em seguida, rebocá-lo para um lugar de águas profundas, dinamita-lo para que perdesse a flutuação e afundasse.

Situações curiosas ocorreram. Grupos de emp regados buscavam solução em sua fé. Foi programado um culto ecumênico com a presença de um padre e um pastor evangélico. Tal evento religioso feriu os brios dos praticantes de cultos afro-brasileiros por não terem sido convidados. O Babalaorixá Jorge da Fé em Deus, hoje já falecido, deu, através da mídia, uma declaração bombástica: Correria sangue e vidas seriam perdidas nessa operação de retirada do navio, a exemplo do ocorrido algum tempo atrás, onde um equipamento de grande porte (uma bucket weel) havia desabado onde perderam a vida 3 pessoas. Essa seria a manifestação da ira da Princesa Ina, entidade que habita um castelo no fundo da Baia de São Marcos, e que, segundo a lenda, teria tido uma das torres do castelo derrubada, na construção do Porto da Vale.

A questão religiosa transformou-se em um problema gerencial: As equipes ficaram amedrontadas, tendo em vista que o trabalho era bastante perigoso e uma entidade religiosa estava profetizando um acidente grave com morte. A Superintendência do porto ficou receosa de uma catástrofe e, havendo uma nefasta profecia, tinha que, alem de redobrar os cuidados com a segurança, prevenir-se das coisas do alem. O Babalorixa Jorge da Fé em Deus, cujo nome na umbanda era ” Ilê Axé Iamová”, foi contactado e com ele foram discutidas eventuais medidas que pudessem aplacar a ira da Princesa Ina.

Foi acertado que a Vale patrocinaria uma manifestação, com Centros Umbandistas, alguns de São Luís, vários de Codó, a realizar-se na área do Porto de Ponta da Madeira. Foram 12 ônibus para o transporte, um rebocador para levar as oferendas até o Canal de Navegação. O culto foi iniciado às 19 horas e prolongou-se até as 22 horas. O culto teve efeito bastante positivo na motivação das equipes de trabalho. A declaração do Babalaorixá de que a ira da Princesa havia sido aplacada, minimizava os receios de acidente e de morte.

A equipe Vale, então Companhia Vale do Rio Doce, com o apoio de algumas das maiores empresas de sal vantagem em operação no mundo, com o pensamento positivo de toda a sociedade e com a ajuda dos céus, fez com que o trabalho se desenvolvesse a contento”.

JORGE AFONSO GUAGLIANE PEREIRA

Jorge Afonso Quagliane Pereira hoje é presidente do Syngamar, da Soamar e diretor executivo da Even Keel, na época, ampresa que agenciava o navio sinistrado.

“Não dá para esquecer o acidente com o Trade Daring. Em todos os anos de atividade portuária jamais presenciei algo tão inimaginável. A quebra ao meio de um navio durante uma operação de carregamento, num terminal importante como o da então Companhia Vale do Rio Doce, com certeza foi um divisor de águas em todos os portos do mundo que operam com granéis sólidos. A Marinha através do Tribunal Marítimo investigou o acidente, apontou causas e indiciou suspeitos. Apesar de tudo que disse há época sobre as condições estruturais do navio, ele estava devidamente certificado e sua documentação em dia. No entanto, segundo depoimento do próprio comandante do Trade Daring, seria necessários considerar alguns cuidados durante a operação de carregamento, compatíveis com a sua idade de uso.

A história da humanidade conta que o homem aprende com seus erros e o Trade Daring logo se transformou numa lição. Empresas, agentes e autoridades marítimas passaram a viver um novo tempo, onde medidas mais enérgicas foram aplicadas para que uma tragédia desse porte jamais se repetisse. A principal delas foi à obrigatoriedade das inspeções regulares com navios acima de 18 anos, sob pena deles sequer atracarem em portos brasileiros.

O Trade Daring, apesar da gravidade do acidente, nos ensinou muito. 16 anos depois, agora investido do cargo de presidente do Syngamar – Sindicato das Agências de Navegação do Estado do Maranhão – tenho procurado, em nome da categoria que represento, oferecer contribuições e sugestões para que medidas de segurança sejam sistematicamente aperfeiçoadas em todos os nossos terminais, único modo de fazer com que a atividade portuária, apesar de toda sua complexidade e riscos inerentes, seja cada dia mais segura, sem percalços e sem acidentes”.

Data da publicação:  janeiro de 1994